sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

CONCURSO PÚBLICO – DIREITO SUBJETIVO À CONTRATAÇÃO


1. O fato hipotético
Realizado concurso público para preenchimento de vagas de magistério no curso de Ciências Jurídicas de determinada universidade pública, constatou-se que vários candidatos foram aprovados, mas não obtiveram média para se classificarem dentro do número de vagas ofertadas.
O edital do referido concurso para o ingresso no magistério trazia em seu bojo divisão de vagas por subárea. Ou seja, concurso de magistério constando 2 vagas para Direito Administrativo, três vagas para Direito Civil e assim sucessivamente. Logo, o candidato ao se inscrever teria, de antemão, escolher para qual subárea iria concorrer.
Após a realização do concurso, surgiu uma situação peculiar. Nem todas as vagas foram preenchidas, mas como o edital previa a disponibilização de vagas por subáreas acabou que algumas disciplinas ficaram com vagas disponíveis, embora houvessem candidatos aprovados, mas não classificados para a vaga a que tinha concorrido. Vamos dar um exemplo. A disciplina Direito Penal tinha vaga disponível, mas o candidato aprovado tinha concorrido para a vaga de Direito Civil. O que fazer?
Tudo porque a Instituição de Ensino tem necessidade premente de preencher as vagas de todas as disciplinas e não obtivera êxito. Ainda pra deixar a situação mais complicada tem a questão financeira, já que a realização de um concurso público demanda uma quantia significativa para os cofres públicos. Além do que há o critério social, pois o candidato aprovado que ficou de fora da vaga a qual concorreu demonstrou ter capacidade técnica para assumir tal vaga.
Diante do impasse, e tendo sido abordada a respeito do tema com frequência por alguns candidatos que se encontram nessa situação, decidi levantar alguns pontos interessantes sobre o tema. Vejamos.
2. Da natureza jurídica do concurso público[1]
Até  pouco tempo, o entendimento dos Tribunais pátrios era no sentido de que, realizado o concurso público, a nomeação e a admissão situavam-se na órbita da discricionariedade da Administração Pública, cujos critérios de conveniência e oportunidade era por esta avaliado, após o que, decidia se estava ou não necessitando de mão de obra para o exercício das atribuições do cargo efetivo ou emprego público. Reconhecidamente, o concurso público era mera expectativa de direito.
Nos dias atuais, o Superior Tribunal de Justiça tem decidido, de forma pacífica, no sentido de que o candidato aprovado em concurso público, desde que dentro das vagas previstas no edital, exceto as de cadastro de reserva, tem direito líquido e certo à nomeação/admissão. Fica patente que o candidato aprovado e classificado dentro do número de vagas oferecidas tem direito líquido e certo à nomeação dos candidatos aprovados. Ou seja, há direito subjetivo à nomeação e posse. Ilustra-se.

DECISÃO[2] - 02/05/2011 - 08h04
CANDIDATO APROVADO E CLASSIFICADO DENTRO DAS VAGAS PREVISTAS NO EDITAL TEM DIREITO A NOMEAÇÃO.
É ilegal o ato omissivo da Administração que não assegura a nomeação de candidato aprovado e classificado até o limite de vagas previstas no edital. A decisão é da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que negou recurso do estado do Amazonas (AM).
O estado recorreu ao STJ após o Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM) decidir que, tendo sido os candidatos aprovados dentro do número de vagas, é indiscutível o direito subjetivo às nomeações e posses.
No recurso, o estado do Amazonas sustentou tanto a impossibilidade jurídica do pedido e do Poder Judiciário adentrar no mérito do ato administrativo. Alegou, ainda, a ocorrência da mudança do entendimento jurisprudencial acerca da aprovação em concurso público.
Ao decidir, o relator, ministro Mauro Campbell, destacou que o candidato aprovado dentro do número de vagas tem direito adquirido à nomeação. Segundo ele, a jurisprudência do STJ é no sentido de que, quando a Administração Pública demonstra a necessidade de preenchimento de cargos no número de vagas dispostas no edital de abertura do concurso, a mera expectativa de direito dos candidatos aprovados – antes condicionada à conveniência e à oportunidade da Administração (Súmula 15 do Supremo Tribunal Federal) – dá lugar ao direito líquido e certo à nomeação dos candidatos aprovados e classificados dentro do número de vagas oferecidas.” (g.n.)

DIREITO ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATO APROVADO DENTRO DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTO NO EDITAL. DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. EXISTÊNCIA. PRECEDENTES DO STJ. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. O Superior Tribunal de Justiça firmou compreensão segundo a qual o candidato aprovado em concurso público dentro do número de vagas previsto no edital tem direito subjetivo de ser nomeado e empossado no prazo de validade do certame.
STJ RMS 26447 / MS - RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA - Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA- DJe 13/10/2009 Todavia, é necessário fazer uma consideração: É a Administração Pública que vai decidir em que momento nomeará ou admitirá, e ela pode praticar o ato até o último dia do prazo de validade do concurso. Portanto o candidato aprovado dentro do número de vagas poderá questionar sua não nomeação depois que o prazo de validade do concurso expirar ou preventivamente, quando o término do prazo de validade do concurso estiver próximo (dois meses antes)”. (g.n.)

FUNCIONÁRIO PÚBLICO. Cargo. Concurso. Aprovação. Não nomeação. Prova da necessidade de pessoal. Direito subjetivo à nomeação reconhecido. Mandado de segurança concedido. Provimento ao recurso ordinário para esse fim. Precedentes. Se a administração pública, tendo necessidade de pessoal, requisita servidores, em vez de nomear candidatos aprovados em concurso cujo prazo de validade ainda vige, ofende direito subjetivo dos aprovados à nomeação, segundo a ordem em que se classificaram.” (RMS 458-RJ. Min. Relator Cezar Peluso, STF, 30/03/2007). (g.n.)

RMS 30459 PA 2009/0178631-7 STJ QUINTA TURMA Publicação: DJe 08/02/2010.
Ementa: ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. CONCURSO PÚBLICO. APELAÇÃO INTERPOSTA CONTRA ACÓRDÃO QUE DENEGOU A SEGURANÇA EM ÚLTIMA INSTÂNCIA. RECEBIDA COMO RECURSO ORDINÁRIO PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE RECURSAL. APLICÁVEL. MANDADO DE SEGURANÇA. IMPETRAÇÃO QUANDO JÁ EXPIRADO O PRAZO DE VALIDADE DO CONCURSO PÚBLICO. INTERESSE DE AGIR. CONFIGURADO. APROVAÇÃO DENTRO DO NÚMERO DE VAGAS DO EDITAL. DIREITO LÍQUIDO E CERTO. PRECEDENTES. RECURSO PROVIDO.
1. Ante a aplicação do princípio da fungibilidade recursal e nos termos do que dispõe o art. 247 do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, a apelação interposta contra acórdão que denega segurança em última instância pode ser recebida como recurso ordinário.
2. Não se reveste de falta de interesse a ação intentada quando já  expirado o prazo de validade do concurso público, caso o debate não alcance os atos da Administração concernentes à realização do certame, mas aqueles que envolvem a nomeação de candidatos classificados.
3. Os candidatos aprovados dentro do número de vagas previstas no edital possuem direito subjetivo à nomeação para os cargos a que concorreram, diante da patente necessidade de nomeação dos aprovados no certame.
4. Recurso conhecido e provido.
Acordão
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, prosseguindo no julgamento, por unanimidade, dar provimento ao recurso, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora, com os acréscimos constantes do voto-vista do Sr. Ministro Felix Fischer, para quem, excepcionalmente, poderá não ocorrer o direito subjetivo líquido e certo se o ente público demonstrar impossibilidade de cumprir a promessa do certame. Os Srs. Ministros Arnaldo Esteves Lima, Napoleão Nunes Maia Filho, Jorge Mussi e Felix Fischer votaram com a Sra. Ministra Relatora. SUSTENTARAM ORALMENTE NA SESSÃO DE 27/10/2009: DR. MÁRCIO ANDRÉ MONTEIRO GAIA (P/ RECDO) E MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL” (g.n.)

TJCE - JUSTIÇA DETERMINA QUE PREFEITO DE ACOPIARA NOMEIE CANDIDATO PARA O CARGO DE BIOQUÍMICO (Publicado em 27 de Abril de 2011 às 14h33)
A Justiça cearense determinou que o prefeito de Acopiara, Antônio Almeida Neto, nomeie J.C.C. para o cargo de bioquímico do Município. A decisão, da 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE), confirmou sentença de 1º Grau.
Consta nos autos que J.C.C. prestou concurso público, em 2007, destinado ao provimento de três vagas para o referido cargo. Ele obteve o quarto lugar no certame. Afirmou que foram convocados os três primeiros colocados, mas um deles manifestou falta de interesse em assumir o cargo.
O candidato assegurou que o prefeito Antônio Almeida Neto, ao invés de convocar o bioquímico para assumir a vaga aberta com a desistência, contratou outra pessoa.
Em virtude disso, J.C.C. impetrou mandado de segurança contra o ato do prefeito. Alegou que o gestor feriu os princípios da impessoalidade e da moralidade administrativas e requereu a nomeação. Citado, o prefeito prestou informações defendendo que a aprovação no concurso gera apenas a expectativa de direito para o candidato.
Em março de 2010, a juíza Ana Celina Monte Studart Gurgel, respondendo pela 2ª Vara da Comarca de Acopiara, concedeu a segurança. “A não nomeação do impetrante para o cargo de bioquímico, para o qual logrou aprovação, se constitui em ato ilegal, vez que inexiste ato fundamentado capaz de lhe dar sustentação”, explicou a magistrada na sentença.
Por se tratar de matéria sujeita ao duplo grau de jurisdição, o processo (nº 1020-82.2009.9.06.0029/1) foi remetido ao TJCE para reexame necessário.
Ao relatar o caso nessa segunda-feira (25/04), o desembargador Francisco Sales Neto destacou que “a desistência de certamista convocado gera para o seguinte na ordem de classificação direito subjetivo à nomeação”. Com base no entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), a 1ª Câmara Cível manteve inalterada a decisão da juíza.” Fonte: Tribunal de Justiça do Estado do Ceará. (g.n.)

Fica patente, portanto, que candidato aprovado dentro do número de vagas existentes previstas no edital possuem direito subjetivo à nomeação para os cargos a que concorreram, diante da cristalina necessidade de nomeação dos aprovados no certame.
3. Das vagas existentes no Curso de Direito para o cargo de magistério superior
Sabe-se que a realização de concurso público pressupõe dois fatos legais. O primeiro é a existência de cargos públicos criados por lei; haja vista uma legislação específica criando tal cargo público. O segundo diz respeito à previsão orçamentária para estas vagas. Em outras palavras, a Administração tem os recursos necessários para nomear e tem necessidade de servidores efetivos.
A Instituição de Ensino, mais especificamente o Curso de Direito, tem vagas a serem preenchidas e não pode frustrar essas nomeações, sob o argumento de que não mais necessita de servidores/professores ou de que não tem os recursos para tal, pois os recursos já existem e, se não houvesse necessidade de pessoal, o concurso não teria sido realizado ou seria para cadastro de reserva.
Ademais, a falta de servidores/professores na referida Instituição, notadamente no curso de Direito, é fato consumado e já teve repercussão, inclusive, na mídia quando noticiou a situação precária porque passa a mesma.
Para o Supremo Tribunal Federal, a não convocação dos candidatos aprovados dentro do número de vagas previstas em edital deve ser objeto de explicações pela Administração Pública, sendo certo que a falta de fundamentação enseja o direito líquido e certo do candidato a ingressar no cargo efetivo.
Observa-se, desta feita, que há vagas para o Curso e a necessidade de se nomear servidores/professores tem caráter de urgência e protelar as nomeações poderia descambar para infringência ao princípio constitucional da eficiência administrativa.
4. Do preenchimento de cargo público para o magistério superior
Vale ressaltar que no último concurso realizado em 2011, candidatos foram aprovados e estão à espera de serem convocados para nomeação e posse. Ocorre que a justificativa para a demora das respectivas nomeações assenta-se no fato dos candidatos terem sido aprovados para subáreas diversas às que se encontram vagas. Mas esta alegação não perdura por muito tempo quando sabe-se que os candidatos habilitados no certame são de suma importância ao desenvolvimento das atividades administrativas desempenhadas pela Instituição de Ensino.
E note-se, o concurso público se deu para o preenchimento de cargo de magistério superior e não para o cargo de magistério superior de determinada disciplina jurídica. Tanto assim é que o requisito para investidura nos cargos era o título de especialista EM DIREITO. Na prova de títulos a questão da especialização na subárea não era motivo de desclassificação, mas de atribuição de uma pontuação maior para fins de classificação.
Hoje em dia até mesmo em teoria do Direito se critica a compartimentalização do Direito em áreas estanques e nos campos do Direito Público e Privado. Os estudiosos asseguram que tal dicotomia Direito Público/Direito Privado está prestes à extinção, uma vez que suas inter-relações chegaram a um patamar que não é possível identificar com clareza os limites entre um e outro. Ou seja, o Direito Privado busca no Estado mecanismos para operacionalizar seus institutos; o Estado ampara-se da norma civil para realizar suas atribuições.
Outra questão deve ser levantada é o fim da cátedra em cursos jurídicos. Desde a edição da Lei nº 5.540/68 esta foi extinta. Ou seja, a extinção da cátedra assegura aos discentes a possibilidade de acesso à democracia de ideias, imprimindo autonomia didático-científica, posto permitir aos docentes expressarem, com relação à matéria ensinada, suas convicções, sem engessar o magistério, já que o professor poderá aplicar seus conhecimentos nas disciplinas que detêm conhecimentos científicos, seja que disciplina for.
Com isso, o docente pode ministrar aulas, por exemplo, de Direito Constitucional ou de Direito Tributário, sem, contudo, ferir a legislação. Na prática é o que ocorre na Instituição de Ensino. Tudo porque o professor fora submetido a um concurso público para o cargo de magistério superior e não para subárea de uma determinada disciplina jurídica, posto que as bancas examinadoras do referido concurso foram constituídas somente em subáreas para viabilizar o certame. E nada mais!
5. Da inconstitucionalidade de professores temporários
Um outro fator jurídico de suma importância deve ser mencionado. Diz respeito à impossibilidade da Instituição de Ensino contratar temporários, caso resista à ideia de contratar os candidatos habilitados no concurso, ora em comento. Vejamos como se manifesta a Corte de Contas estadual:

O Ministério Público de Contas[3] reafirmou a obrigatoriedade da saída dos professores temporários da UEA em favor da formação de carreira via ingresso por meio de concurso público.
O entendimento foi lançado nos autos do processo n. 5697/2010, recurso interposto, por professores, contra decisão da Corte que fixou prazo para substituição do pessoal.
No Parecer n. 2943/2011/MP-ESB, o Ministério Público de Contas faz a distinção entre a limitação temporal para exame da legalidade dos atos de admissão (decadência) e o dever ilimitado e irrenunciável de dar cumprimento ao comando constitucional impositivo de concurso e carreiras no serviço público. A permanência, por cinco anos, de servidores investidos precariamente, não cria a garantia de permanência no serviço público nem transforma as funções temporárias em cargos efetivos, que devem providos somente por concurso público”. (g.n.)

O que se quer deixar claro é que, na situação em tela, o candidato - se encontra aprovado no concurso público e existem terceirizados, contratados temporários ou requisitados exercendo exatamente a mesma função do aprovado no certame -, deixa de ter expectativa de ser nomeado (cargo efetivo) e passa a ter direito a exigir a sua nomeação (cargo efetivo), já que há cargo efetivo  vago e previsão orçamentária.
Tudo porque,a entidade que assim age está, flagrantemente, infringindo o princípio do concurso público (art. 37, inciso II da Constituição da República), pois havendo candidatos aprovados, o procedimento correto a ser adotado pelo Poder Público, sob a regência do princípio da moralidade é a convocação dos mesmos.
Nessa situação, conforme explanado, o candidato passa a ter direito subjetivo de ser nomeado, deixando de ter mera expectativa de direito, conforme julgados acima transcritos.
A jurisprudência do STJ refere que não há direito subjetivo à nomeação de candidatos aprovados fora do número de vagas do Edital. Deixa esta nomeação a critério da Administração Pública caso haja necessidade. No caso da Instituição de Ensino, os fatos deixam evidente esta necessidade da Administração. Primeiro porque é fato notório a realização constante de processos seletivos simplificados realizados pela Instituição de Ensino. Segundo porque a falta de professor para ministrar aulas está sendo suprida com a presença em sal de aula de professor voluntário, o que deixa patente, neste contexto, a necessidade de professor.
[1]Dr. Bernardo Brandão Costa - Advogado Especialistas em Concursos Públicos e Servidores. http://www.pciconcursos.com.br/consultoria/direito-a-nomeacao-dentro-do-numero-de-vagas. Acessado em 28.4.2011
[2]www.stj.jus.br. Acessado em 4/5/2011.
[3]http://mpc.tce.am.gov.br/?p=690 Acessado em 7/5/2011.