Na
sessão desta quarta-feira (21), por unanimidade de votos, o Supremo
Tribunal Federal (STF) manteve decisão do Tribunal de Justiça de
Minas Gerais (TJ-MG), que julgou ilegal a anulação, pelo governo
mineiro, de parcela integrante da remuneração de uma servidora, sem
que lhe fosse dado o direito ao contraditório e à ampla defesa.
O
julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 594269 teve início na
sessão de 31 de agosto, com os votos do relator do caso, ministros
Dias Toffoli, e do ministro Luiz Fux. Na ocasião, ambos se
manifestaram pelo desprovimento do recurso, ajuizado na Corte pelo
Estado de Minas Gerais.
Em
seu voto, o relator explicou que o governo mineiro tomou sua decisão
com base na Súmula 473 do STF, editada em 1969, ainda sob a égide
da Constituição Federal de 1967. Esta súmula, revelou o ministro,
admitia a possibilidade de a Administração “anular seus próprios
atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles
não se originam direitos, ou revogá-los por motivo de conveniência
ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos e ressalvada, em
todos os casos, a apreciação judicial”. Mas esse entendimento não
foi recepcionado pela Constituição de 1988, observou o ministro
Dias Toffoli.
Isso
porque, conforme o ministro, o artigo 5º, inciso LV, da Constituição
Federal de 1988 é claro ao garantir o direito ao contraditório e à
ampla defesa, inclusive em processos administrativos, e que o inciso
LIV do mesmo artigo estabelece que ninguém será privado de seus
bens sem o devido processo legal.
Ele
lembrou, nesse contexto, que não estava em julgamento o mérito do
desconto salarial pretendido pelo governo mineiro, mas sim o direito
ao contraditório e à ampla defesa da servidora. Segundo ele, o
julgamento em curso no STF não exclui a possibilidade de o governo
de Minas Gerais renovar um processo de revisão dos vencimentos da
servidora, porém dentro dos pressupostos legais.
Voto-vista
A
ministra Cármen Lúcia disse concordar com o relator. Para ela, não
se pode atingir o patrimônio jurídico de uma pessoa sem que lhe
seja assegurado o direito ao contraditório e à ampla defesa. No
caso em debate, apontou ela, é incontroversa a inobservância dessa
garantia constitucional.
Ela
também afirmou concordar com o relator no ponto em que ele assentou
que o poder de autotutela é um instrumento que a administração tem
para verificar a legalidade de seus provimentos. Entretanto, disse a
ministra, não se pratica a autotutela sem limites. Nesse ponto,
Cármen Lúcia lembrou que, atualmente, não se considera autotutela
um poder, mas um dever.
A
ministra Cármen Lúcia considerou que sempre que um ato
administrativo puder afetar o patrimônio de alguém deve ser
garantido ao interessado o exercício da ampla defesa. "Há a
necessidade de se formalizar processo administrativo, com respeito ao
devido processo legal, até para se evitar arbitrariedades",
repetiu a ministra.
"Não
tenho dúvida quanto ao acerto da decisão recorrida", disse a
ministra ao também votar contra o recurso do Estado de Minas Gerais.
Todos os ministros presentes à sessão se manifestaram pelo
desprovimento do recurso.
Súmula
473
Ao
final de seu voto, a ministra Cármen Lúcia propôs à Corte que se
estude uma alteração no enunciado da Súmula 473 da Corte, para
fazer constar que a administração pode anular seus atos, desde que
garantido, em todos os casos, o devido processo legal administrativo.
Para a ministra, tendo em vista a repercussão geral reconhecida na
matéria e com a alteração proposta, a súmula poderia obter o
efeito vinculante.
O caso
A
servidora ingressou no serviço público em 1994, quando pediu e teve
averbado tempo de serviço cumprido anteriormente na iniciativa
privada. Na oportunidade, foram-lhe deferidos quatro quinquênios.
Entretanto, cerca de três anos depois, ela recebeu comunicado dando
conta de que teria percebido indevidamente valores referentes a
quinquênios irregularmente concedidos e que o benefício seria
retirado de seu prontuário e, o montante pago a maior, debitado de
seus vencimentos mensais.
Inconformada,
a servidora ingressou em juízo e obteve a reversão do ato, decisão
esta confirmada pelo TJ-MG. Contra tal decisão, o governo mineiro
recorreu ao STF.
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. Acessado em 23.9.2011)