O
Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou na manhã desta
quarta-feira (12) o julgamento de um Recurso Extraordinário (RE
607607) com repercussão geral reconhecida que definirá se
servidores públicos do Estado do Rio Grande do Sul têm ou não
direito a reajuste mensal do vale-alimentação com base na Lei
Estadual 10.002, de 1993.
Até
o momento, há quatro votos pela concessão do reajuste, segundo
parâmetros fixados pelo relator da matéria, ministro Marco Aurélio,
e quatro votos pelo não conhecimento do recurso, ou seja, pela
impossibilidade que o processo tenha o mérito julgado pelo Plenário
da Suprema Corte por não tratar de matéria constitucional.
A
primeira vertente reúne, além do relator, a ministra Rosa Weber e
os ministros Ricardo Lewandowski e Ayres Britto. A divergência foi
aberta pelo ministro Luiz Fux e seguida pelos ministros Dias Toffoli,
Gilmar Mendes e Cármen Lúcia Antunes Rocha. Diante do empate, a
matéria será retomada com os votos dos ministros Joaquim Barbosa e
Celso de Mello, que justificadamente não participaram do julgamento
de hoje pela manhã.
Reajuste
mensal
O
RE 607607 foi interposto por uma servidora estadual contra decisão
da Justiça do Rio Grande do Sul que, ao julgar improcedente o
pedido, afirmou que o reajuste depende de lei específica de
iniciativa do Poder Executivo, não cabendo ao Judiciário fixar
índices.
A
servidora alega que a decisão viola o caput do artigo 37 da
Constituição e seu inciso XV, que trata da irredutibilidade de
subsídios e vencimentos de servidores públicos. O Estado do Rio
Grande do Sul, por sua vez, sustenta que, de acordo com artigo 169 da
Constituição Federal, não se pode aumentar despesa pública com
pessoal sem legislação específica.
Controvérsia
O
tema é controverso entre as Turmas do STF. A Primeira Turma, ao
apreciar caso idêntico em agosto de 2008, da relatoria do próprio
ministro Marco Aurélio (RE 428991), deferiu o pagamento das
diferenças sob o entendimento de que o artigo 169 da Constituição
não autoriza a administração pública descumprir a lei,
especialmente em caso de benefício de natureza alimentar. O
dispositivo constitucional veda a concessão de vantagem ou aumento
remuneratório sem que haja prévia dotação orçamentária.
Outras
decisões do STF entendem que a discussão é de natureza
infraconstitucional, conforme foi expresso nesta manhã pelos
ministros que votaram pelo não conhecimento do recurso.
O
ministro Marco Aurélio, por sua vez, reafirmou seu entendimento
expresso em 2008. “Se há lei estabelecendo, em certo preceito,
vale-refeição em favor dos servidores, e, mais adiante, em outro
dispositivo, prevendo a edição de decreto para reajustá-lo,
pressupondo-se a queda progressiva do poder aquisitivo da moeda em
decorrência da inflação, naturalmente não ocorre exercício de
poder discricionário e, sim, vinculado (à lei)”.
Ao
citar Celso Antônio Bandeira de Mello, o ministro ressaltou que a
administração pública deve cumprir as leis. Para o ministro, em
casos como o presente, o Poder Judiciário não estende vantagem
prevista em lei, mas determina que a norma seja respeitada. “Afirmar
que incumbe ao Poder Executivo optar pelo cumprimento ou não de
legislação representa o abandono do Estado de direito.”
O
ministro distinguiu as verbas de natureza indenizatória, como é o
caso do auxílio-alimentação, das verbas de caráter remuneratório.
As primeiras, afirmou ele, “devem possuir certa flexibilidade
exatamente para que possam cumprir a finalidade a que se dirigem”,
que é o de indenizar prejuízo experimentado pelo servidor público.
Para
ele, há dois planos distintos: o primeiro é o do direito subjetivo
que o servidor tem a determinada vantagem pecuniária de natureza
indenizatória. “Se a lei atribuiu o direito, com perdão pelo
truísmo, então é inegável que ele existe”, disse. O relator
acrescentou que, uma vez definidos os parâmetros para a
quantificação do reajuste por ato administrativo, cabe que estes
sejam cumpridos.
Ao
acompanhar o relator, o ministro Ayres Britto frisou que “nada é
mais elementar do que o alimentar”. A ministra Rosa Weber, por sua
vez, disse que “o poder da administração pública, no caso, não
é discricionário”.
Ao
acolher o pedido feito pela servidora, o ministro-relator condenou o
Estado do Rio Grande do Sul a indenizar as diferenças entre a
aplicação do índice previsto em lei e aquele efetivamente recebido
pela servidora no pagamento do vale-refeição. Ele determinou que
essa diferenças devem levar em conta os cinco anos anteriores à
data do ajuizamento da ação pela servidora.
Como
a matéria teve repercussão geral reconhecida, a decisão que for
tomada pelo Supremo será aplicada aos demais casos idênticos. O
ministro-relator informou que cerca de 26 mil processos aguardam o
pronunciamento da Corte.
Divergência
Primeiro
a divergir, o ministro Luiz Fux disse que o recurso extraordinário
trata de confronto entre normas estaduais e citou a Súmula 280 do
STF. De acordo com o enunciado, não cabe recurso extraordinário por
ofensa a direito local.
O
ministro Dias Toffoli votou no mesmo sentido. Para ele, não há no
processo debate sobre matéria constitucional e, portanto, o mérito
na ação sequer deveria ser analisado no Plenário. No entanto, o
ministro disse ficar “preocupado” com a ideia de que existe um
“direito constitucional à reposição da inflação”. Ele
lembrou que a lei que fixou o reajuste mensal do vale-refeição foi
elaborada antes do Plano Real. “Era uma outra cultura.”
Ao
também acompanhar o voto do ministro Luiz Fux, o ministro Gilmar
Mendes observou que seria o caso de se cogitar até mesmo a
obsolescência da lei do Estado do Rio Grande do Sul. “A discussão,
aqui, de reajuste mensal, é absolutamente descolada da própria
realidade. Como fazer reajuste mensal de vale-refeição quando se
tem inflação de 1% ou 2%? É algo absolutamente inadequado.”
Ele
acrescentou que a lei pode sim autorizar o reajuste, mas dentro da
marcos legais. “Do contrário, será decisão extravagante, mesmo
que se trate de verba indenizatória, mesmo que se trate de verba
alimentar.” Segundo o ministro Gilmar Mendes, o modelo de reajuste
nesses casos é vinculado orçamentariamente. “Há aqui o limite
não só da reserva do financeiramente possível, mas da reserva do
orçamentariamente fixado. Essa é uma premissa básica de
responsabilidade fiscal”, concluiu.
(http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=217841
Acessado em 12.9.2012)