Dentre as diversas formas
de entidade estatal que integram a Administração Pública Indireta
consta a figura da fundação. Sua previsão constitucional está
disposta no inciso XIX do art. 37 da Constituição Federal1,
parte final, onde remonta à lei complementar sua regulamentação
devendo, desta feita, definir as áreas de atuação de fundações
instituídas pelo poder público. O Decreto-Lei nº 200/1967,
recepcionado pela Constituição da República de 1988 estabelece seu
conceito. Vejamos.
Art.
5º Para os fins desta lei, considera-se:
(...)
IV
- Fundação Pública - a entidade dotada de personalidade jurídica
de direito privado, sem fins lucrativos, criada em virtude de
autorização legislativa, para o desenvolvimento de atividades que
não exijam execução por órgãos ou entidades de direito público,
com autonomia administrativa, patrimônio próprio gerido pelos
respectivos órgãos de direção, e funcionamento custeado por
recursos da União e de outras fontes. (Incluído pela Lei nº
7.596, de 1987)
(…)
§
3º As entidades de que trata o inciso IV deste artigo adquirem
personalidade jurídica com a inscrição da escritura pública de
sua constituição no Registro Civil de Pessoas Jurídicas, não
se lhes aplicando as demais disposições do Código Civil
concernentes às fundações. (Incluído pela Lei nº 7.596, de
1987) (g.n.)
Sem dúvida,
tempos atrás a Fundação causou divergências doutrinárias quanto
à sua natureza jurídica. Há Autores, como o ilustre Hely
Lopes Meirelles2,
que defende sua constituição como de direito privado, consoante a
redação dada pela EC 19/98 ao inciso XIX do art. 37, sob pena de
tornar-se semelhante à autarquia, o que dificulta diferenciar
Fundação desta última.
Celso
Antônio Bandeira de Mello3,
embora reticente à natureza jurídica de direito privado assegura
que a nova redação do inciso XIX do art. 37 da CF/88 “já
afasta, de per si, qualquer veleidade de pretender-se extrair-se do
recente Código Civil”.
Marçal
Justen Filho4
chega a afirmar que “se a natureza impuser o regime de direito
público, será descabida a criação de uma fundação pública.
Seria caso, então, de instituir autarquia.”
Maria Sylvia
Zanella di Pietro5
assegura que as fundações públicas de direito privado se submetem
às normas de natureza pública quando instituídas ou mantidas pelo
poder público.
A fundação
não apresenta natureza associativa. Ou seja, possui finalidade
pública – prestar serviço público de ciência, ensino, pesquisa,
extensão, saúde, o que difere das associações ou corporações.
Labutam em prol do interesse coletivo, não tem fins lucrativos.
Exemplo típico: as Universidades Públicas.
Assim, seu
regime jurídico é administrativo, isto é, sob a égide do
direito público, incluindo as prerrogativas e sujeições que lhe
são inerentes. Nada, portanto, impede que a Lei instituitodora e seu
Estatuto, quando se tratar de fundação como pessoa jurídica de
direito privado, adote regime jurídico-publicístico.
Disso
decorre que seus bens são vinculados ao desenvolvimento da
atividade que realiza. Sua atividade não configura atividade
de exploração econômica, e sim prestação de serviço público,
caso contrário seria inconstitucional a vinculação de bens e
recursos públicos para seu desenvolvimento, uma vez que é mantida
com recursos públicos. Tudo porque o estado tem o dever de
contribuir com os recursos necessários à sua existência.
Em outras
palavras, a fundação pública de direito privado terá patrimônio
e receita próprios, mas seus recursos públicos serão advindos do
orçamento anual, subsidiada pelo poder público. Mas nada impede de
receber tais recursos da iniciativa privada, inclusive de entidades
não governamentais, sejam elas nacionais ou internacionais, como
também, formalizar parcerias e celebrar convênios com entes
públicos.
Disto
decorre sua subordinação à fiscalização pelo Tribunal de
Contas, controle administrativo exercido pelo poder Executivo e
supervisão de gestão financeira, consoante o art. 26 do Decreto-Lei
n. 200/676
(arts. 49, inc. X, 72 e 73 da CF/88).
Sem fins
lucrativos, tal fundação estará sujeita à Lei de Licitações
– 8.666/93.
O quadro
permanente de servidores públicos da instituição será formado a
partir de concurso público. Seu pessoal será regido pelo
Regime Jurídico Único – Estatutário, conforme dispõe o art. 39
da CF/88, uma vez que o Supremo Tribunal Federal7
entendeu, em sede de cautelar, que
diante
do restabelecimento da redação originária do art. 39, caput, da
Constituição de República, os regimes jurídicos informadores das
relações entre Estados, o Distrito Federal e os Municípios e seus
respectivos servidores seriam o estatutário e o regime
jurídico-administrativo8.
Em suma,
entendo que a legislação administrativa impõe não só ao
regramento constitucional do concurso público, sendo o
servidor público investido em cargo público, regido pelo
Estatuto do Servidor Público, e não detentor de emprego
público, sob a regência da CLT. Isso porque a Fundação Pública
de Direito Privado, além das razões acima expostas, é regida pelo
regime administrativo, cuja atividade administrativa é voltada para
a prestação de serviço público sem fins lucrativos.
1Art.
37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos
Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios
obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade,
moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
(…)
XIX -
somente por lei específica poderá ser criada autarquia e
autorizada a instituição de empresa pública, de sociedade de
economia mista e de fundação, cabendo à lei complementar,
neste último caso, definir as áreas de sua atuação; (Redação
dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
2MEIRELLES,
Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, 31 ed., São Paulo:
Malheiros, pág. 66.
3MELLO,
Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo
Brasileiro, 25 ed., São Paulo: Malheiros, pág. 185.
4JUSTEN
FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo Brasileiro, 1 ed.,
São Paulo: Saraiva, pág. 124.
5DI
PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo, 22 ed., São
Paulo: Atlas, pág. 440.
6Art.
26. No que se refere à Administração Indireta, a supervisão
ministerial visará a assegurar, essencialmente:
I - A realização dos
objetivos fixados nos atos de constituição da entidade.
II - A harmonia com a
política e a programação do Govêrno no setor de atuação da
entidade.
III - A eficiência
administrativa.
IV - A autonomia
administrativa, operacional e financeira da entidade.
7No
mérito, será preciso esperar para saber se o STF entenderá em que
situação a entidade da Administração Pública Indireta poderá
adotar o regime estatutário ou o regime trabalhista.
8http://jus.com.br/artigos/17517/fundacoes-estatais-de-direito-privado-na-area-de-prestacao-de-servicos-de-saude
Acesso em: 25/8/13.
por Glaucia Ribeiro