Ocorrendo
fato superveniente que possa influir na solução do litígio, cumpre
ao órgão julgador – juízo singular ou tribunal – levá-lo em
consideração ao decidir o caso. Com esse entendimento, a Terceira
Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento a recurso
da Serpros Fundo Multipatrocinado, para reformar decisão do Tribunal
de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) que anulou execução movida
contra o Grupo OK Construções e Incorporações.
A
Serpros propôs ação de execução de título judicial contra o
Grupo OK, com o objetivo de receber valores reconhecidos em ação de
cobrança julgada procedente. No curso da execução, o Grupo OK
alegou nulidade por vício da citação no processo de conhecimento,
afirmando que o mandado não indicara os dias de prazo para
apresentação da contestação.
O
juízo de primeiro grau não reconheceu a nulidade, considerando que
a sentença de mérito na ação de cobrança já havia transitado em
julgado e só poderia ser desconstituída por meio de ação
rescisória. O Grupo OK recorreu dessa decisão à segunda instância.
O acórdão
O
TJRJ acolheu o pedido da OK para anular o processo. Segundo o TJRJ, o
mandado de citação, para ser válido, deve conter expressamente o
prazo para a defesa do réu, em dias, não valendo sua substituição
pela genérica expressão “prazo da lei”. Além disso, o mandado
deve advertir o réu de que a falta de impugnação dos fatos
alegados pelo autor fará com que sejam tomados por verdadeiros.
“A
ausência de qualquer desses requisitos importa na nulidade, de pleno
direito, da citação, que, ainda que ocorrida no processo de
conhecimento, poderá ser arguida a qualquer tempo pela parte
prejudicada, podendo ser conhecida, mesmo na fase de execução da
sentença, de ofício, pelo julgador”, afirmou a decisão do TJRJ.
A
Serpros interpôs recurso especial ao STJ, sustentando que, em
diversas situações após o ato apontado como imperfeito, o Grupo OK
compareceu espontaneamente aos autos e se valeu de inúmeros
instrumentos processuais para a defesa de seus interesses, não se
preocupando “em suscitar a nulidade de sua citação com fundamento
no suposto defeito do mandado”.
Além
disso, a Serpros alegou que o Grupo OK deveria ter solicitado a
reabertura do prazo para apresentação de contestação quando
compareceu espontaneamente aos autos da execução, mas esse
comparecimento supriu a nulidade da citação.
Fato
novo
Antes
que o recurso especial fosse julgado, a Serpros informou um fato
novo: o trânsito em julgado de sentença proferida em outro
processo, no qual o Grupo OK também buscava a anulação da citação
na ação de cobrança.
Nesse
outro processo – uma ação declaratória de nulidade de citação,
que tramitou paralelamente à execução –, o juiz reconheceu que o
mandado de citação na ação de cobrança pecou pela falta de
menção aos dias de prazo e também à penalidade por não
apresentação da defesa. No entanto, segundo o juiz, esses vícios
deveriam ter sido apontados pela parte na primeira oportunidade que
teve. Como não o fez, ocorreu a preclusão.
Ao
analisar o recurso especial da Serpros, o relator, ministro Villas
Bôas Cueva, destacou que a coisa julgada formada na ação
declaratória de nulidade inviabiliza o reexame do mesmo pedido de
nulidade nos autos da execução, sob pena de violação do princípio
da segurança jurídica.
Ele
observou que a ação declaratória ajuizada em paralelo pelo Grupo
OK tinha o mesmo objetivo que o recurso interposto para o TJRJ no
processo de execução (do qual derivou o recurso especial), ou seja,
a anulação da citação. Mas não só isso: também a causa de
pedir era a mesma, já que, na ação declaratória, o grupo
empresarial igualmente alegou o vício da ausência do prazo
quantificado em dias.
Providência salutar
“O
julgamento definitivo da ação declaratória deve ser tomado em
consideração, como fato superveniente, nos termos do artigo 462 do
Código de Processo Civil”, disse o ministro. Esse artigo
estabelece: "Se, depois da propositura da ação, algum fato
constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no
julgamento da lide, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de
ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a
sentença."
De
acordo com Villas Bôas Cueva, a jurisprudência do STJ é no sentido
de que o artigo 462 não se aplica apenas a juiz de primeira
instância, mas também aos tribunais de segundo grau e aos tribunais
superiores.
Para
o relator, “o julgamento deve refletir o estado de fato da lide no
momento da entrega da prestação jurisdicional”. Segundo ele,
levar em consideração um fato superveniente que afete o direito em
discussão é “providência salutar e recomendável, a ser tomada
até mesmo de ofício pelo magistrado, a fim de evitar decisões
contraditórias e prestigiar os princípios da economia processual e
da segurança jurídica”.
Com
base nesse entendimento, a Terceira Turma deu provimento ao recurso
da Serpros e cassou o acórdão do TJRJ, pois mantê-lo significaria
ofender a coisa julgada formada na ação declaratória. Foi
restabelecida, assim, a decisão de primeira instância no processo
de execução.
(http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=109086
Acessado em 8.4.2013)